Os romanos parecem ter sido os primeiros a marcar as
distâncias e deixar assinaturas nas vias que iam abrindo e ainda hoje
encontramos os seus conhecidos miliários. Se a medida padrão era a
milha, daí “o miliário”, importa saber a sua equivalência para o
sistema métrico.
E como era medida a milha? A passo, é claro, de um soldado,
de um centurião. Nada mais nada menos que milia passuum ou mille
passus - mil passos - bem medidos, porque um passo é a
distância entre dois batimentos do pé esquerdo, é o chamado passo
dobrado, valor aproximado de metro e meio. Os centuriões não eram gigantes,
nem podiam dar muitas passadas largas, daí que os 75 cm seriam um bom padrão.
As medições actuais atribuem à milha romana valores entre 1 481 e 1 580
metros. Quanto à milha terrestre que os ingleses têm no “conta-milhas” dos
seus carros – equivale a 1 609 metros, se for no barco já vale mais – 1 855
metros.
Já agora, vamos procurar uma outra unidade – a légua.
Aqui as variações ainda são maiores. Para os romanos, poderia ser milha e meia,
o que convertido em medida mais pequena seria 7500 pés. Polegadas, pés,
jardas e milhas, foram sempre medidas inglesas com que me familiarizei, até
à custa das anedotas – um espertinho vai ao talho e querendo gozar o talhante,
pede-lhe uma jarda de porco. O magarefe embrulha três pés de porco e
diz-lhe “three feet make one yard”, o que é verdade.
A distância “légua” encontra-se em alguma literatura
europeia, com influência de viagens, e frequentemente em Portugal e no Brasil.
O valor é variável, conforme os autores e as épocas.
Foi considerada a distância aproximada de caminho percorrido
por um homem durante uma hora. Em 1855, antes da adopção do sistema métrico, até
se legislou que a légua métrica seria equivalente a 5 000 metros. No
entanto, o seu valor varia entre os 4 000 e os 7 500 metros. Dessa
variabilidade terá surgido a expressão “é como a légua da Póvoa”,
significando que não tem um valor exacto.
Todo este arrazoado veio-me à memória por razões
hagiográficas – o Senhor do Padrão e o Senhor do Padrão da Légua.
Hoje, vou deixar ficar por aqui mais umas “pedras” sobre o “Senhor do Padrão”,
especialmente aquele que ainda hoje tem muitos devotos na zona do Carvalhido,
aqui no Porto, que levam uma vida sempre a correr, e talvez por isso também lhe
chamem o Senhor dos Aflitos. Para complicar um pouco mais a história,
além dos “pedrões” este Senhor tem um cruzeiro, pelo que será mais correcto
designá-lo por “Cruzeiro do Senhor do Padrão”.
Desde tempos imemoriais nos têm colocado “pedras no caminho”
que, quando este era de terra, até agradecíamos em dias de chuva. O caminho longo que saía do Porto para o
Norte, percorrido pelos caminhantes, romeiros e festeiros, tinha lugares de
paragem, como as “alminhas”, as capelas e os cruzeiros. Embora o caminho viesse
da parte alta do Porto, do Olival, hoje Cordoaria, vamos recuar até uns anos
antes da abertura da rua de Cedofeita, que só começou em 1762, até aí seria
mais um caminho e mais tarde foi a Rua da Estrada, saída do Porto para a Póvoa,
como era conhecida em 1781.
As minhas interrogações começaram pela data inscrita no Cruzeiro
do Senhor do Padrão – 1738. Assim sendo, foi erigido muito antes de Cedofeita
ter sido aberta, como rua. Era um caminho que na parte mais alta chegava ao que
hoje designamos por Ramada Alta, lugar onde a partir de 1737, começaram a
erigir a Capela de Nossa Senhora das Dores ou do Senhor do Calvário. Convém
lembrar que as festas do Senhor de Bouças (Matosinhos) tinham começado poucos
anos antes – 1732. O caminho a seguir à Ramada Alta, era uma estrada que
cruzava sopés de montes, conhecido como a Falperra.
Os romeiros vindos do Porto usavam este caminho e percebe-se
que por essa época se tivesse erguido o cruzeiro na Falperra, lá ao
fundo da rua, hoje mais ou menos no cruzamento da Rua da Constituição com a Rua
9 de Julho, talvez em frente à Fonte da Falperra. Uma pausa na caminhada
seria sempre bem aproveitada junto de uma fonte.
Não me parece que como já li, que este cruzeiro marcasse a
distância da primeira milha, à saída do Porto, pois a distância é de 2,5
km. Aceito como mais provável um outro “pedrão” que vem mais para diante,
depois de sairmos do Porto – o Padrão da Légua – a tal légua de
aproximadamente 5,5 km. O cruzeiro seria mais um ponto de devoção
religiosa.
Aproveitemos uma sede de água e prometo voltar em breve com longas histórias do Cruzeiro do Senhor do Padrão ou dos Aflitos.
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