in O Tripeiro, 1948
Dinheiro, jóias, preciosidades e até documentos, tudo muito
valioso, de preferência fechado dentro de arca ou cofre, vindo de tempos
antigos com “th”, escondido e de preferência sem dono é um “thesouro”.
No texto que escrevi sobre o Bairro Operário do Monte
Pedral, falei de um tesouro escondido na pedra fundamental. Mas não foi o
único. São vários os exemplos que podemos encontrar de relatos sobre tesouros
escondidos, menos do que os descobertos.
Recuemos aos oitocentos mais uma vez e passo a recordar
palavras de Pinho Leal sobre o “monumento erigido pela cidade do Porto a sua
Magestade Imperial e Real o Senhor D. Pedro Quarto, Rei de Portugal“ que
doou o coração à cidade:
«No largo até 1834 denominado Praça Nova e hoje D. Pedro (se este “hoje” fosse hoje seria Praça da Liberdade), em frente da casa do senado da Câmara (também já demolida em 1916 para abrirem a a Avenida das Nações Aliadas), foi lançada a primeira pedra d’este monumento, no dia 9 de Julho de 1862.
Em um cofre de prata, juntamente com as moedas d’
ouro, prata e cobre da época, foi guardado o auto e a lâmina comemorativa, com
uma inscrição em latim, encomiando o príncipe e designando o dia da cerimónia.»
Aqui ficamos com água na boca. Sabemos que este cofre é mais
valioso que o do Bairro Operário, porque é de prata e até tem moedas de ouro.
Mas Pinho Leal não desvenda se foi enterrado debaixo das patas do cavalo da
Praça Nova. As obras do metro do Porto não mexeram no monumento, se calhar por
receio de ainda terem de escavar mais e no fim não encontrarem senão água.
Este D. Pedro homenageado, tinha desembarcado na Praia dos
Ladrões, (hoje preferimos
chamar-lhe Praia da Memória) ou na praia Arnosa de Pampelido, e não, como diziam
historiadores, na praia do Mindelo, que fica quase légua e meia mais
acima.
Era o dia 8 de Julho de 1832, e aí vão chegando 60 navios e
um exército libertador para vir derrotar as tropas do irmão absolutista, D.
Miguel. O local ficou imortalizado com a construção de um obelisco em pedra,
com inscrições em painéis de calcário, nas quatro faces do soco, uma delas com a
proclamação do Rei a incitar os soldados à “vitória certa”. Vou socorrer-me de descrição alheia, (Luís
Silveira, in O Tripeiro) para aquilatar da sua altura: «O monumento será uma pyramide no estylo
de obelisco na altura de 75 palmos sobre uma base de 30 palmos, tendo no
ápice uma estrella radicante, no centro da qual estará o N.º 1832, para denotar
a epocha do desembarque: no corpo do obelisco, e na face sobre o Poente (que é
a da frente ) haverá uma medalha que representa em alto relevo a effigie do
Libertador; e nas 4 faces do pedestal quatro diversas Inscrições.»
No entanto, ainda hoje o monumento tem um tesouro escondido
nas suas fundações, porque os “ladrões” não conseguiram arrancar o obelisco do
sítio.
A rainha D. Maria II,
filha de D. Pedro, esteve presente no dia de colocação da “pedra fundamental”,
ou “primeira pedra” como agora se diz, no dia 1 de Dezembro de 1840. Acho que
ela viu esconderem um pequeno cofre por baixo dessa pedra. O que continha esse
cofre? Segredo bem guardado? Joel Cleto diz que a chave deixou de estar à
guarda do presidente da Câmara e os interessados até podem vê-la no MUMA (Museu
da Memória de Matosinhos) no Palacete Visconde de Trevões, que tem a “Chave
da Memória” em exibição pública.
Termino com títulos de jornais, anunciando datas de
lançamento de outras primeiras pedras, sob as quais podem ir procurar tesouros
escondidos:
8 de Setembro de 1756 – Assenta-se a primeira
pedra da igreja de N.ª Sr.ª do Terço e da Caridade
12 de Outubro
de 1759 – Benze-se a primeira pedra do Convento da Formiga
3 de Setembro
de 1861 – D. Pedro V inaugura a primeira pedra para a construção do Palácio de
Cristal
11 de
Fevereiro de 1898 –
Tem lugar o lançamento da primeira pedra do Hospital de Crianças D. Maria Pia
27 de Maio
de 1899 – D. António
Barroso promete presidir ao lançamento da primeira pedra da nova Igreja de
Cedofeita
A mania de esconder também se serviu de certas manhas.
Conta-se que para evitar a pilhagem francesa aquando das invasões, pintaram com
cal o altar de prata de Sé do Porto.
Os lavradores das terras de Boticas, na tentativa de salvar
alguns bens, enterraram as garrafas do seu vinho, que passou a ser conhecido
como “vinho dos Mortos”.
E para concluir, conto o meu tesouro pessoal. Sempre tentei
ser um habilidoso e sempre aprendi não só a fazer, como a “ver fazendo”. Nunca
fui trolha, mas ajudei o meu pai a erguer paredes, num armazém que tínhamos.
Recordo a minha grande ideia de assinalar essa data, com uma moeda de alumínio
de dez centavos – “um marcelinho”, dentro de um tijolo, que lá ficou
devidamente rebocado, estucado e pintado – a minha fortuna!
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