domingo, 30 de março de 2025

Um longo folhetim sobre a vida de Camilo - Parte VI (Por ruas tripeiras e outras terras)

 


Este capítulo do folhetim, mais que topográfico, será quase só, uma listagem de casas por onde Camilo passou.

Começando pela capital, se pelo centenário do seu nascimento, não havia a certeza se teria nascido em Alfama ou na Rua das Pretas, no bicentenário ainda menos. Sabemos que Camilo, ao longo da sua vida voltou muitas vezes a Lisboa, para casa de amigos, hospedarias e até hospitais e casas de saúde, mas nomes sabemos poucos.

Já na Invicta a documentação e a referência a sítios é muito variada, bem como a vontade de Camilo em mudar tão facilmente de casa, como outros homens mudavam de gravata.

Mais ou menos cronologicamente vou listando:

Cadeia da Relação
De 12 a 23 de Outubro de 1840, preso pelo rapto de Patrícia Emília.
De 1 de Outubro de 1861 a 16 de Outubro de 1862, pelo crime de adultério, enclausurado no quarto de malta n.º 8.

Rua Escura

A tal “rua fétida”, morada dos primeiros tempos.

Rua dos Pelames, n.º 44
Aqui vive em 1844, aluno de química na Academia Politécnica. Camilo namorou uma vizinha que morava na trapeira da Rua do Souto.

Rua da Fábrica do Tabaco
Em 1849 foi comensal na Hospedaria Francesa, hoje Grande Hotel de Paris.

Rua de Santa Catarina, n.º 41
Viveu aqui em 1850, antes do estar junto com Ana Plácido.

Rua Chã ou Rua Cimo de Vila, à Sé
Em 1851, morou por aqui, para estar perto do Seminário Diocesano.

Rua de Santo António, n.º 82
Reside aí por finais de 1852. Os irmãos Sousa Guedes fazem-lhe uma espera, agridem-no e Camilo defende-se a tiro de pistola.

Rua da Bella Princesa
Em Janeiro de 1853, esta foi a morada que deu numa audiência em tribunal, pelo incidente da rua de Santo António.

Hospedaria Águia d’ Ouro
Em 1853, ficou nesta hospedaria, conhecida como a “matriarca das estalagens portuguesas”.

Rua do Pinheiro
Em 1854, havia uma casa na quinta do Pinheiro – uma pension, que parece ter sido a moradia que o romancista mais gostou. Recomendou-a a um amigo com a seguinte descrição:

«É uma espécie de hotel garni. Dás 480rs e tens um bom quarto para dormir, um alimento frugal, a minha sala para as tuas visitas, uma quinta para passear e um profundo silêncio em redor, e isto no centro da cidade.»

Rua de Cedofeita
Em 1855 residiu numa casa de hóspedes na rua de Cedofeita, tendo escrito:

«O futuro Plutharco dos homens ilustres d’esta freguesia de Cedofeita, em que tenho a honra de morar.»  
Há quem diga que seria na Rua da Sovela, onde havia hospedagem módica para estudantes.

Candal
1856, vai par o Candal, afogar as mágoas pela Ana Plácido, nos braços de uma costureirinha.

Rua do Sol, n.º 8
Mora na casa de D. Eufrásia Carlota de Sá, qu o deve ter tratado muito bem, dadas as várias referências que Camilo lhe faz. No verão passa temporadas na Foz do Douro.

Viana do Castelo
Em 1857, depois de muitas cartas trocadas como o amigo José Barbosa, director da ”Aurora do Lima” decide ir viver para Viana. Se noutras terras a escolha fora simplesmente por amizade ou a fugir de alguém, aqui, foi fundamentalmente para ir trabalhar no jornal.

O sítio que escolheu em Viana foi precisamente o mesmo, onde morei pela primeira vez que saí da casa dos meus pais. Precisamente Valverde, em São João de Arga, no princípio da encosta do Monte de Santa Luzia. Nas suas obras há referências ao Mosteiro de S. Francisco, aí perto, já em ruínas quando por lá andei, só não fala do possível túnel que atravessaria o monte e chegaria ao convento da Carmelitas, umas léguas mais a norte, nas Ursulinas.

Rua chrismada de D. Pedro, antiga rua do Bispo, ao pé da Praça Nova, paralela com a do Laranjal – casa nº 13
Camilo faz esta descrição da sua morada no Porto, para dar alojamento a este amigo de Viana.

Rua da Picaria
Uma casa de hóspedes onde se alojou com Ana Plácido. Daí foram viver para a Foz do Douro.

Rua do Almada n.º 378
Casa que fora de Pinheiro Alves. Camilo e Ana Plácido festejam aí o baptizado dos dois filhos. Ficaram aí por algum tempo. No verão iam para Leça da Palmeira.

Rua do Triunfo (hoje Rua D. Manuel II)
Camilo muda-se para um prédio nesta rua, em frente ao portão do parque de estacionamento do Palácio de Cristal.

Rua de S. Lázaro
Em 1872, Camilo habita uma casa nesta rua.

Rua do Bonjardim, nº 860
Camilo está instalado nesta casa que pertencera a Pinheiro Alves. «Entre o café o o cognac quando descrevo o gabinete de Camilo no Porto, em 1872, habitando ele o prédio n.º 860 da rua do Bonjardim.»

Casa de S. Miguel de Seide
Depois de 1875, Camilo reside na casa de S. Miguel de Seide, com algumas deslocações a Lisboa e Coimbra, com veraneio na Póvoa do Varzim.

Rua de Santa Catarina, n. 458

Por algum tempo residiu em Santa Catarina, onde a 9 de Março de 1888, casou com Ana Plácido.

Última morada
Finalmente, foi “hóspede” do amigo Freitas Fortuna no cemitério da Lapa, a partir de 1890.
Foi o seu último regresso ao Porto, para a Lapa, e deixou claro que não o levassem para outro qualquer panteão, porque o lugar dele era junto do seu amigo que lhe abriu o jazigo para sua última morada.

A enumeração das restantes terras por onde Camilo passou seria um roteiro para bem conhecer o norte de Portugal, pelo que vou deixar referência só a meia dúzia delas, para se poder explorar numa quinzena de férias, sem indicação especial do seu peso na vida de Camilo.

Se quiserem começar a etapa em Lisboa, parem em Coimbra e esqueçam o Porto para visita mais demorada. Rumem depois a Vila Real, dêem um salto a Vilarinho de Samardã, que é pertinho. Se forem a Friúme, não deixem de comprar milhos em Ribeira de Pena. Se não os souberem fazer, peçam ajuda à cozinheira Gertrudes Engrácia, a quem Camilo tece os mais profundos encómios:
«A ela lhe devo a cura da minha anemia quando tinha 23 anos, e aos seus guisados de boi, às tripas de boi, às “troixas” de recheio e aos bifes de presunto de Melgaço, que ela lhe fazia.»
Esta Gertrudes era cozinheira do Barão de Forrester, na Ramada Alta e Magalhães Basto cognomina-a como “A madame Brillat Savarin, de Camilo, não tinha apelido, era de um plebeísmo raro.»

Não cheguem ao presunto a Melgaço, fiquem por Viana. Faço uma menção pessoal a uma aldeia nos arredores da Ribeira Lima, minha conhecida por visitas a familiares, que me trazem Perre e Outeiro à memória. Foi lá que aprendi a comer arroz doce e leite creme.
Em 17 de Agosto de 1855, a cólera invade o Porto e chega a Viana. Camilo recomenda a um amigo:

 «Vais comigo, para Quinta da Costa – Tem muitos cuidados hygiénicos e alapa-te em Perre

Se quiserem ir a águas, procurem as Caldas da Taipas, passem pelos arredores em Fafe e Guimarães, onde Camilo tinha amigos e onde colheu muita inspiração para algumas obras. Para águas mais frias, Camilo preferia a Foz do Douro ou as praias da Póvoa do Varzim.

Se gostarem de jesuítas, podem ir prova-los a Santo Thyrso, na grafia antiga, onde Camilo passeava «todas as tardes em volta da Praça, com o filho Jorge, durante longas horas, sempre no mesmo passo e no mesmo terreno.»

Isto já leva mais que meia dúzia e para fechar o capítulo deixo um desafio aos “camiliófilos”.

Boas leituras à procura de…
Sabem a que obras pertence esta dúzia de terras do norte de Portugal?

São Gens de Monte Longo, Castelões, Santa Olaia de Roboredo, Prazins, Ronfe, Cerva e Limões, Refojos de Basto, Landim, Vilar de Frades, Santo Estevão de Urgezes, Travanca, acabando mais para o centro com a obra mais conhecida – Castro Daire.


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