Hoje vou dedicar algumas linhas à toponímia relativa às ruas do “Monte”. Há muito por onde escolher e começo por topónimos aglutinados – “Monsanto” e “Montebelo”. Entre a santidade do primeiro e a beleza, qual a rua que mais mereceu o chamamento?
Começo pela Rua do Montebelo, e vamos à Foz, que vale
bem as vistas. Quem entrar na Montebelo, tem de passar pela pequenina Rua
dos Prazeres e ainda hoje é um deleite entranharmo-nos nas ruelinhas da Foz
Velha, pela parte alta. É difícil identificar todo aquele “monte” sem o
casario, mas a beleza da foz do rio Douro, entrevê-se entre uma ou outra casa,
invejando-se, logo ali à entrada, um pátio desafogado, com as belas vistas
sobre o “monte”. Não se pode perder o aqueduto nem o fontanário para esquecer o
que fizeram na Quinta do Montebelo.
O topónimo atribuído à Rua de Monsanto, parece não
ter sido muito consensual junto de estudiosos. Sim, porque tantas vezes
desconhecemos as razões da Comissão Toponímica. Inicialmente, foi Rua do
Regado e o topónimo deveria perdurar para lembrar uma das maiores quintas
de Paranhos, anterior à nacionalidade, que foi “vendida” por dezoito jantares.
A Rua de Monsanto parece evocar a sublevação monárquica, ocorrida em
1919, que daria origem à Monarquia do Norte. Os monárquicos seriam
derrotados aqui no “Monte Santo” e eu pergunto qual? O Monte das Regueiras
ou Reduto da Medalhas ali para o Monte Pedral, ou foi tudo noutro sítio
qualquer? De facto, Regado evocava mais a história de Paranhos e a rua deveria
ter esse nome.
Passemos às ruas
“Monte de…” e vamos por ordem alfabética para isto levar alguma ordem.
Rua do Monte
Alegre – Hoje é uma
rua pacata acima do carvalhido e para o interior da Constituição. Rua com
comércio tradicional, mercearias e pequenas lojas que viviam da gente
trabalhadoras nas inúmeras fábricas das redondezas. Hoje tudo vai fechando. De
vez em quando há uma nova luzinha, como um restaurante italiano, com bons pizzaiolos.
Rua do Monte
Aventino – Por aqui a
história vai mais longe. O Monte das Antas (designação anterior) hoje
desaparecido ainda me deixou memórias. Antes do complexo desportivo, já era
zona de desporto e lazer para a família. Se recuarmos mais séculos, vemos que
na guerra do Cerco do Porto já foi palco de contestações laborais. Estas
começaram logo durante o Cerco, quando os operários que construíam trincheiras
não queriam trabalhar por falta de pagamento. Mais tarde, foi baptizado como “Monte
Aventino”. A industrialização da cidade também originou jornadas
reivindicativas. Embora os operários têxteis e fabris fossem os mais numerosos,
a voz que mais reclamava era a dos tipógrafos que criaram a Associação
das Classes Laboriosas. O seu local para concentrações públicas começou por
ser o Largo do Bonjardim, mas a urbanização do sítio expulsou-os para local
mais amplo - o Monte das Antas. Era necessário mostrar aos de cá o que se fazia
lá fora. Escolheram, como madrinha, uma das sete colinas de Roma – o Monte
Aventino – local onde os Romanos subiam quando queriam fazer os seus
protestos para se libertarem do jugo dos patrícios. Assim ficou o nome que se
propagou à rua.
Rua do Monte da
Bela – Também aqui
poderíamos ter um monte belo, tal o panorama daqui desfrutado. Inicialmente o
monte tinha nome estranho - Monte de Marganchos. Se quiserem ir lá, podem
partir ali do Jardim da Corujeira, pela Rua do Monte da Bela acima e vão
deparar com um belo panorama a partir do Miradouro do Monte da Bela.
Germano Silva,
por seu lado, estraga-nos o deslumbramento, quando nos lembra a história:
«Este topónimo não tem nada a ver com alguma formosura feminina que por
ali tivesse vivido. Aqui o nome “bela” tem de ser entendido como uma corruptela
de “vela” e tem a ver com a ação de velar, de vigiar. Isto quer dizer que onde
houve a aldeia do Outeiro da Vela e está agora o Monte da Bela,
deve ter existido uma atalaia ou torre vigia utilizada para defesa de ataques inimigos.»
Rua do Monte dos
Burgos – Que pena ser
a minha rua vizinha e eu ter tão pouco a dizer dela.
Sei que a actual
rua de Monte dos Burgos foi antes Rua Nova de Paranhos, Estrada para Vila do
Conde e Estrada Real n.º 30, do Porto a S. Bento da Porta Aberta, com o Km
3,900 em frente ao n.º 628. Antes disso talvez não passasse de um caminho, ao
lado da mata da Prelada. Provavelmente a designação “Monte” possa vir da “mata
da Prelada”, subindo a rua dos dois extremos, o cimo do monte poderia ser mais
ou menos pela entrada do antigo Parque de Campismo. Durante os séculos XVIII e
XIX, alargaram o caminho e “endireitaram-no” para vir a ter direito a Estrada
Real. Por aqui entrava e saía o trânsito para o Norte, para a Estrada dos Nove
Irmãos.
Sendo ladeada
por bouças e quintas, a edificação só começaria pelos finais dos oitocentos. No
princípio do século XX, os pedidos de licença no Arquivo Distrital, já
mencionam o topónimo “Rua do Monte dos Burgos”. Em 1912, há um requerimento dirigido à
Misericórdia por Joaquim Pereira da Silva, morador nesta rua, que pretendia
comprar a referida Bouça de Fora, oferecendo por ela 420 000 réis, e «ficando com o direito depois da compra, a
poder edificar nessas bouças quando lhe convier».
Começava a especulação imobiliária.
Quanto aos “Burgos” deixo o estudo para os geólogos. Não se
aceitando a definição do Elucidário de Viterbo, de que “burgo” «Significava uma cadêa de lugares, ou
ajuntamento de casas, nas raias ou fronteiras, seguidas umas às outras […]», dêmos
mais crédito à teoria de Joel Cleto, que atenta logo no plural da palavra, pelo
que dificilmente seria um burgo no monte. Ele recua, segundo alguns estudiosos
400 mil anos, para ir buscar a origem dos “bulgos”, calhaus rolados, que para
sul evoluíram para “burgos” e para norte temos a Rua do Seixo. Ora seixos e
bulgos seriam rochas que encontraram por aqui, no tempo em que o mar chegava a
estes sítios. Nem os animais falavam…
Rua do Monte de Campanhã – Por aqui as dúvidas ainda são
maiores. Sei que hoje está lá construído um bairro, agora chamado “Agrupamento
Habitacional do Falcão”, habitado desde os inícios deste século. O topónimo
“Falcão” fica para outra altura, mas recorrendo mais uma vez aos pedidos de
licença no Arquivo, existem algumas variantes – só para a Rua do Monte
(em 1923, que a situavam entre a Rua do Falcão e a Corujeira de Baixo), para a Rua
do Monte do Falcão ( em 1914), hoje topónimo independente – Rua do Falcão
ou simplesmente Lugar do Monte, como figura na planta de Teles Ferreira
em 1892, onde as ruas ainda não têm nome.
Rua do Monte do
Cativo – embora não
saibamos quem foi o “cativo”, o topónimo latino “captivis” já existia por cá
antes da nacionalidade. D. Teresa, na Carta de Doação do Couto do Porto que, em
1120, fez ao Bispo D. Hugo, marcou os limites do Couto e em determinado ponto
lia-se «[…] até ao monte que chamam Pé de Mula, e daí ao Monte Captivis, assim
como divide Cedofeita e Germalde».
Naturalmente
aqui ainda não se falava da rua, mas do lugar que ficava entre os montes da
Lapa e do Cativo. Os antigos almanaques e roteiros definiam o início e o fim
das ruas e aqui poderíamos dizer:
A Rua do
Monte Cativo começa na Rua do Melo e termina na Rua da
Constituição, pertence à freguesia de Cedofeita. Ora talvez tenha começado
a ser rua, por volta de 1883, quando alargaram a Rua do Melo e procederam ao
alinhamento da Rua do Monte do Cativo. Logo no início, ainda hoje estão as Escadas
do Monte Cativo que nos levam lá acima a Salgueiros, donde temos uma bela
panorâmica do Porto. Sinal que estamos no cimo do monte.
Uma curiosidade
que ainda não desvendei é o topónimo “Rua do Nogueira”. Aparece num
pedido de licenciamento para a construção de um bairro de 10 casas que a
Litografia Nacional pretende construir, em 1931, num terreno que possui no
ângulo formado pelas Ruas da Constituição e do Nogueira”. Hoje este arruamento
é a parte final da rua do Monte do Cativo.
Bem, isto vai
longo e tem de continuar no próximo episódio.
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