Rua do Monte dos Congregados – para o portuense
normal que conhece pouco da sua cidade, se lhe perguntarem onde fica esta rua,
a cabecinha é capaz de recordar logo o mote tripeiro –“Vai pedir para a
porta dos Congregados” e vê logo a igreja ao lado da Estação de S. Bento,
mas não vê a rua.
Os turistas que, à custa de roteiros, tão bem informados
andam, até lá iriam se lessem algures a verdade. «A Rua do Monte dos
Congregados é a rua mais alta de toda a cidade.» E dizem os geógrafos
que, de facto, é por aqui o ponto mais alto do Porto. Quanto à rua, dizemos o
mesmo, pertence à freguesia do Bonfim, começa nas Escadas ou melhor no Jardim
do Monte do Tadeu e termina na Rua da Alegria.
Como o meu objectivo era falar das ruas “monte de …” não
falta aqui história, nem montes. O tal dos Congregados chamava-se Monte de
Santa Catarina, quando, por volta de 1785, o nosso rei D. João V, devoto da Congregação
dos frades do Oratório ou da secular de São Filipe de Néri, ofereceu uma
propriedade já fora do Porto, no alto de Santa Catarina, mais para a encosta da
actual rua da Alegria. Mudaram o nome ao monte, que passou a ser dos
Congregados, porque os frades construíram aí a sua casa de repouso e
recreio, com um hospital. Lembremo-nos que eles já tinham sido “regalados “pela
edilidade, em1680, quando esta lhes ofereceu a Capela de Santo António e um
terreno anexo para construírem um convento, na baixa, precisamente no local
onde hoje se encontra a Igreja dos Congregados.
Chegam os liberais que extinguem as ordens religiosas e os
Congregados vão à vida deles, em 1834. A Quinta que deles teve o nome vai ser
vendida. A Câmara ainda tentou protelar a venda, no intuito de fazer ela novos
arruamentos por aí, mas em Maio de 1837, a Quinta é vendida a preços de
saldo em hasta pública. É comprada por um “brasileiro de torna-viagem”, de
apelido Moreira que até vai baptizar uma rua por aqueles sítios.
Com um empreendimento daqueles havia muito a desbravar nos
montes vizinhos. Por baixo, existiam grandes pedreiras que o tal Sr. José António
Moreira tratou de explorar, a partir de 1852. Nesse sítio, a Cooperativa dos
Pedreiros fundou aí a sua sede, tanta foi a matéria prima que daí retiraram.
Uma Companhia francesa, a quem deram a exploração da água do Porto, construiu
nas pedreiras reservatórios de água e se subirmos ao cimo de um
depósito, temos o ponto mais alto para ver o Porto e arredores. Para os mais
endinheirados, podem ir ao edifício vizinho, onde trabalhei num escritório no 8.º
andar e subir até ao topo. Até têm o Restaurante Portucale, onde nesses
tempos aparecia no fim da conta, um suplemento referente ao aluguer dos
talheres de prata. A vista é magnífica. Depois confrontem-na com a do miradouro
do Monte do Tadeu, de que falarei noutra altura.
Voltando à Rua do Monte dos Congregados, ela fica
precisamente nas faldas da pedreira, e resultou
do desmembramento da quinta em talhões para edificação de habitações. Alguns
terrenos até foram oferecidos pelo sr. Moreira e daí lhe terem retribuído, com
a atribuição do seu nome para topónimo de uma rua mais abaixo. A rua do Monte
dos Congregados deve ter sido aberta por volta dos anos 30 do século XIX.
Encontrei uma licença no Arquivo Distrital, datada de 1897,
para construção nesta rua, de um bairro de 26 casas, num terreno em
socalcos, próximo do depósito pertencente à Companhia das Águas do Porto. De 1911,
há outro pedido para construção de outro bairro de casas. Vemos assim a
habitação a crescer, não só para os mais abastados, nas ruas principais, mas
também para o operariado mais necessitado e que por estes anos era mão-de-obra
barata nas fábricas do Bonfim. As suas casas é que ficavam lá para trás dos
montes…
Se quisermos terminar com um ar mais bucólico, podemos ler
outro pedido de licença, do Pe José Barbedo, não na rua, mas na Viela
dos Congregados, para construção de um muro e um barracão próximo do moinho
de vento. O sítio era alto e nessa data, 1877, estaria tudo muito mais
desafogado.
Rua do Monte da Costa – Como não é do monte do Costa,
não tenho nada a ver com o sítio. A página do código postal até nos dá as
coordenadas de GPS 41,163603, -8,586667, dizendo que pertence à freguesia de
Campanhã, mas quem não sabe fica na mesma. Para os aficionados do FCP posso
dizer que fica ali mesmo ao lado do Dragão.
Hoje, a rua deixou de ser “um monte, para passar a ser rua de
gente com dinheiro para viver nestes empreendimentos de luxo, que estão a
crescer na rua e arredores.
Quanto ao monte, só a inclinação das ruas nos permite pensar
que existiu. Faria parte do Monte Aventino, seria ainda do Monte das Antas?
Destes dois montes, já aqui falámos, desta Rua do Monte da Costa não
reza a história.
Rua do Monte da Estação – Por aqui as minhas memórias
têm muitas raízes. Durante muitos anos, passei-lhe sempre ao lado, quando saía
da Estação de Campanhã e subia Pinto Bessa, ou mesmo subindo e
descendo a Rua da Estação, vindo do liceu. Infelizmente, nesse tempo,
não aproveitei o melhor que a Rua da Estação tinha para oferecer – restaurantes e
tascos, que ainda hoje são famosos.
A rua começa ali no largo da Estação, ou melhor ainda temos
de ir um bocadinho na Justino Teixeira, para a apanhar e depois é trepar por
ali acima, e lá para a frente chegamos à nova Avenida de 25 de Abril. Da Rua do
Monte da Estação tenho memórias dos Irmãos Romeira, que eram os nossos
fornecedores de tapetes, carpetes e oleado. Quantas vezes não tive de
vir de lá de cima até ao largo da Estação, com um rolo de oleado inglês, de Lancaster,
a imitar o taco, a sorte é que era a descer... A peça tinha 1,83 cm de altura, pudera
era inglês, logo media exactamente 6 pés, o mesmo comprimento de um colchão de
casal. Medidas inglesas… Também da Justino Teixeira, há memórias da
família lá ter vivido alguns anos.
Um facto curioso desta rua é um portão, em pedra lavrada,
estilo barroco, que existia até há pouco tempo e era entrada para o Casal de
Cima. Este Casal fazia parte da Quinta de Vila Meã, cuja casa nobre fica
hoje do outro lado das linhas de caminho de ferro. Esta Quinta, de que há
documentação desde 1473, foi sendo desmembrada em vários casais que foram
desaparecendo. Hoje, a quinta volta a estar na ordem do dia, com a prevista passagem
da linha do TGV, que iria derrubar a casa nobre. Com os últimos proprietários,
ficou conhecida como a Quinta do Mitra. Há poucos anos, a edilidade
comprou-a e recuperou a casa. Agora …
A saga continua nos próximos capítulos…
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