quarta-feira, 20 de novembro de 2024

Do Monte de Curraes ou dos Fogueteiros, à Quinta e ao Hospital

 

Paranhos não é terra de montes e vales. Parece que os pontos mais elevados podem ir dos 90 aos 150 metros acima do nível do mar, pelo que poderíamos estar a falar de outeiros aqui ou ali. Na fala do povo, ficou sempre o Monte e por isso lá tentarei chegar ao velho monte de Curraes, que pertenceria à freguesia, até ao limite da Linha de Cintura, (Caminho de Ferro do Minho e Douro nesta planta quadriculada de 1903).

É sempre difícil descobrir a origem dos topónimos e os dicionários e as leis só complicam, repare-se numa portaria de 1985, que define atribuições da GNR, e que tem lá pelo meio um tal artº 4.º, questionando os “curraes”.

«Quanto às posturas locais, a fiscalização incidirá especialmente sobre:

a)               Higiene das localidades, tomando conhecimento dos focos de infecção que se produzirem provenientes de pocilgas, currais, estrumes e curtumes, etc., com prejuízo da saúde pública.»

Ora que “curraes” haveria por aqui para dar origem ao nome? Se por ali cheira mal o melhor é destruir o monte.

A urbanização foi sempre a maior inimiga dos montes, mesmo quando ainda tinham de ser abertos a pá e pica e transportada a terra em carrelas e carros de bois, como bem mostram estas fotos, perto dos Currais, na construção do Bairro de Casas Económicas de Costa Cabral, junto a Fernão de Magalhães, nos anos 40.

... E vai-se derrubando o Monte e abrindo a rua.

Horácio Marçal descreve a aldeia de Currais composta de casebres imundos, habitados por gente pobre e que ficava entre as escarpas do monte com o mesmo nome. Nos anos 50, segundo ele, o lugar já possuía «inúmeras vivendas de feição moderna, não obstante a rusticidade do lugar e das ruas circundantes que não correspondiam à categoria dos prédios».

Mas como não há festa nem festança em que não estralejem foguetes no ar… Nalgum lado eles tinham de ser feitos e os montes dos Currais eram um bom sítio para uma fábrica de fogo de artifício.


Em 1907, Joaquim José Devesa pede licença para construir um barraco a 300 metros da via pública, para guardar os artefactos.  Em 1908, Joaquim Devesa pede licença para construir fábrica de artifício. E ou os donos mudavam ou então os Currais eram o sítio ideal para os fogueteiros e nesse caso, até poderia ter sido conhecido como o monte dos fogueteiros. Repare-se que três anos depois, em 1911, António Rodrigues pediu licença para construir um muro de 50 metros por 2 e meio de altura, num terreno onde estava instalada a fábrica da pólvora, no Monte de Currais. Muito fogo se fazia por ali.

Para apagar o fogo faz sempre falta água e Horácio Marçal diz-nos onde a havia -«…entre os montes dos Murganhos e o de Currais passa estreito valeiro que é percorrido pelo regato deste mesmo nome – Currais.»  

Curioso que a referência aos montes na sua Monografia é “Murganhos”, embora nas plantas encontradas eu tenha deparado apenas com “Marganchos”.

Parece que essa ribeira de Currais seria afluente do rio Tinto. Hoje deve andar encanada por baixo das casas. Por lá também encontrei a presa das Consortes, que serviria para rega de vários lavradores. A água também era conduzida para os lavadouros ali perto, onde também não faltavam os coradouros. Em documento coevo encontrei referência ao rio das Lavadeiras, que deveria ser a própria ribeira.

 

Quinta do Semide ou melhor a Quinta dos Currais

Acho que a designação para a área onde se instalou o Sanatório-hospital Rodrigues Semide e posteriormente a Universidade Lusíada, não deveria ser designada por Quinta do Semide, em virtude de Manuel José Rodrigues Semide, já ter falecido quando compraram aqueles terrenos e nem ele nem seus herdeiros terem sido deles proprietários.  Como o Hospital era do Semide, acharam que a quinta também era.

Ora na verdade, estamos precisamente em terrenos dos Currais. Seria o Campo da Bouça ou então como o mestre de obras a designa - “a Quinta dos Currais”, e que vem referido no pedido de licença entrado na Câmara para a construção do Sanatório-hospital. Entrava-se ali pela antigo Caminho de Currais a que depois foi dado o nome de rua de Rodrigues Semide e mais abaixo a Travessa do Currais passou a chamar-se rua Diamantina.

Agora deixemos o Sanatório Hospital para outro dia, que este Semide também tem muito que contar.

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