Aqui nesta foto, vejo a renovação mais conseguida da minha rua. Já tive a oportunidade de passar por lá e ver as traseiras destas casas que mantiveram umas tiras de quintalitos, reabilitação bem feita mesmo das caves destas casas. A memória ainda fica nesta janela-porta de vidros aos quadradinhos – era a barbearia.
a renovação
residencial – confronte-se com imagem da barbearia de portas verdes
O Toninho foi o nosso barbeiro durante muitos e muitos anos,
vivia na casa ao lado, com os pais e a irmã, costureira; lembro-me do casamento
dela e de uma frase que o irmão disse nesse dia ou na véspera “Hoje o Zé (o
noivo) tem de afiar o canivete”, hum? Bem, termos de gente grande… A
rapariga é que já não era costureira, era quase modista a competir com a famosa
Candidinha. A grande modista da época era a dona Candidinha, onde muitas
mães de posses fizeram ou mandaram fazer um vestido, um enxoval ou o
saial para o baptizado da criancinha.
O Toninho barbeiro, como não podia deixar de ser, também era nosso cliente – fornecíamos-lhe o pó de sabão da Claus, por exemplo. Tinha umas tacinhas de prata para pousar o pincel, um pouco de água no fundo, uns pozinhos no pincel que estava pronto para ensaboar a cara.
Os complementos para barba e cabelo, o Toninho também comprava na drogaria. O lápis cutoline, para estancar o sangue, mais para revender a algum cliente, porque ele usava a pedra hume que nós também lhe vendíamos avulso. Assim como o pó de talco e a laca alemã, marca A.Costa.
O famoso creme bálsamo 444, para depois de barbear, ou um after
shave Gibbs, Aqua Velva, Floyd, Tabak ou OldSpice, tudo marcas ainda hoje
no mercado.
O cabelo também precisava de tratamento e não podia faltar o
Restaurador e o Petróleo OLEX.
Quanto ao restaurador, loção para disfarçar as brancas, a
fórmula do caseiro, feito pelo meu pai, era bem mais eficaz e económica. Era um
líquido amarelo, cujos componentes nunca divulgarei, que era necessário agitar,
porque os pózinhos precipitavam… e lá tinha a frase imprescindível no rótulo: “Agitar antes de Usar”.
Há tesourinhos deprimentes,
na rede, onde estas relíquias do passado ainda são trazidas para o presente.
“Um preto de
cabeleira loira ou um branco de carapinha não é natural.
Natural é cada um andar com a sua cor de cabelo – Restaurador OLEX…”
Há pouco tempo, descobri uma etiqueta da loção capilar,
que andava no meio de um livro como marcador. As etiquetas são outra memória da
drogaria, de que não ficou rasto. Tínhamos dezenas de produtos manipulados ou
simplesmente empacotados, cujas frascos iam devidamente etiquetados com um
rótulo de marca da casa – uns rectângulozinhos com letras azuis.
Ficam as memórias dos clientes, como o Toninho que, antes de
abrir de tarde, (só o podia fazer depois das três para os clientes fazerem a
digestão) ainda passava pela drogaria para dois dedos de conversa e para dar
uma espiadela no nosso Jornal de Notícias, que o meu pai comprava,
sacramentalmente todos os dias, a ver se as palavras cruzadas estavam
completamente resolvidas e ver a solução de alguma que lhe tivesse falhado.
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