Rua do Triunfo, rua do Heroísmo, rua da Firmeza, rua da Alegria, rua da Restauração … (rua da Lealdade) são designações toponímicas encomiásticas da vitória liberal na cidade do Porto. Deixei propositadamente entre parênteses a “Lealdade”, um valor tão querido aos apoiantes de D. Pedro, mas esta designação não faz parte deste conjunto de alterações. A actual rua de Álvaro de Castelões, visconde, engenheiro, colonialista, nada teve a ver com o liberalismo, nem a anterior designação desta artéria, que ganhou o nome de uma fábrica de tabaco existente ali por perto, já em Costa Cabral, a fábrica “A Lealdade” - que quando a conheci era jardim de infância da OSMEC, obra social do ministério para quem eu trabalhava.
Falando em ensino, até um liceu poderia ter ficado por ali.
O arquitecto Marques da Silva, em 1901, elaborou o projecto para um edifício do
Liceu do Porto que deveria ser erigido na rua do Triunfo. Mas o projecto não
avançou e optaram pela sua localização no Bonfim e em Cedofeita para o Alexandre
e o D. Manuel. A rua, à data, ainda não era D. Manuel II e se o liceu fosse
para lá até podia ser razão para a renomear – ainda estávamos na monarquia.
Voltando à rua e ao Palácio de Cristal, ficaram boas memória
desses tempos pós 25 de Abril. No Palácio, houve fins de semana culturais e o 1.º
Encontro Livre da Canção Popular, realizou-se em 6 de Maio de 1974, com a
presença de Luís Cília, Zé Mário Branco, Zeca Afonso, Fausto, Adriano e muitos
outros. Pelo lado da política, lembro especialmente o 1.º Congresso do CDS, em
1975, em que os apoiantes encheram o pavilhão e ficaram cercados por
manifestantes de extrema-esquerda, com palavras de ordem como “Morte aos
fascistas”, com tiros e “cocktails molotov” para animar a noite, até o COPCON
ir lá “serenar” os ânimos.
Estes tempos foram muito “livres” e até permitiram que um
grupo revolucionário baptizasse a rua como – Rua José Estaline.
Pintaram-lhe as placas, mas a comissão toponímica da Câmara não aceitou.
Cá para mim, a rua foi sempre D. Manuel II e nunca pensei na
razão de o topónimo ter sobrevivido aos ideais republicanos. Para isso, vamos
debruçar-nos um pouco sobre o edifício mais importante desta rua que está na
origem do topónimo actual. Estamos a falar do Palácio das Carrancas.
Começaram a construí-lo nos finais dos setecentos e hoje não vale a pena
contar-lhe a história. Só lembrar que foi residência de personalidades famosas,
de vários lados políticos, como os generais das Invasões Francesas de um e de outro
lado – Soult, Wellesley e Beresford. D. Pedro IV fez dele quartel general, até
a metralha lhe cair e cima e recuar para Cedofeita. Maltratado o Palácio, foi
anos mais tarde vendido à Casa de Bragança que o recuperou e foi mesmo
escolhido como residência oficial dos reis portugueses, nas suas vindas
ao Porto. Com a implantação da República o palácio esteve muitos anos fechado.
Na véspera de 5 de Outubro de 1910, o rei partiu para Inglaterra porque já sabia que no dia seguinte ia ser deposto. Mas D. Manuel foi um rei “patriota” e mesmo no exílio fez uma “obra de caridade”, oferecendo o Palácio à Santa Casa da Misericórdia do Porto. O rei, amigo das letras e do conhecimento, sabia que era preciso salvaguardar a cultura.
Em 1937, o museu do Porto – O Museu Allen- já não cabia lá em
baixo, na Restauração. A Santa Casa cede o palácio à Câmara para instalar o que
hoje é o Museu Nacional de Soares dos Reis. Pela gratidão do acto
monárquico, a Câmara, em plena República, aprova o nome do rei, para memória
futura desta rua – Rua D. Manuel II. Dos Quartéis ao Triunfo,
venceu a monarquia.
Sem comentários:
Enviar um comentário